quarta-feira, 7 de maio de 2008

Filomedusa: Sobre Sapos, Rãs e a Estrada

Saulinho em dois momentos: dedilhando uma viola-de-cocho
e destruindo sua guitarra com a Filomedusa.


Junte alguns costumes indígenas, uma espécie de anfíbio bi-colorido, um advogado com mestrado em gestão pública, uma publicitária que parece um fofo desenho animado, um tímido músico de óculos, um estudante de cursinho pré-vestibular e alguns instrumentos musicais em cima de um palco e você terá a banda Filomedusa. Seus integrantes não só têm faixas etárias e formações distintas, como, aparentemente, gostos musicais idem.

Mas em cima desse mesmo palco a coesão estética fala absurdamente mais alto e por isso o advogado esquece por instantes os tramites da profissão e se concentra no pulsante contrabaixo, a publicitária esquece de briefings e brainstorms e se enfurece sem perder a ternura nos vocais jamais, o tímido músico faz da guitarra um rifle de assalto preciso e o estudante debulha a bateria como jamais faria com as questões de química do vestibular.

Química é o que esse quarteto acreano, formado há menos de um ano, mostra ter quando sobe no palco. Voltando recentemente de uma mini turnê pelas principais cidades do Circuito Fora do Eixo, com um pequeno álbum gravado às próprias custas, a banda traz na bagagem a experiência de tocar fora de casa e a certeza de que fez bonito.

O tímido guitarrista da Filomedusa, além de rifes e solos, é também o cara que toma a frente do grupo quando o assunto é a participação ativa da banda no processo que envolve o trabalho em torno da cultura independente. E foi com ele que batemos um papo sobre estrada, sapos e o show da Virada.

Catraia diz:
Vc falou na entrevista ao Programa Fora do Eixo, na Rádio Aldeia, quando ainda estava em Belo Horizonte, que o melhor que uma banda pode fazer é circular. Hoje, já com os pés em Rio Branco, valeu a pena pra ti e pra tua banda esse circuito de várias cidades feito por vocês?

Saulo diz:
Valeu Muito. Além de conhecer algumas cidades que ainda não conhecia, de uma certa forma aumenta o público que acaba conhecendo sua música que até então não conhecia...

Catraia diz:
Além de divulgar, uma viagem como essa também estimula criativamente a banda, não?

Saulo diz:
Sem dúvida...Uma mini turnê dessas, incentiva ainda mais a produção de coisas novas, os lugares diferentes de diferentes paisagens e pessoas que a gente encontra no caminho acaba sendo fonte de inspiração para criar.

Catraia diz:
A prova disso foi a música que tu compôs recentemente. O resultado tem a ver com o pé na estrada, com os outros ares, né? ;-)

Saulo diz:
Sim, talvez. Mas pra compôr o Tema Parati, tenho outras fontes de inspiração, coisas boas que vieram me acontecendo durante a semana! Hehe!

Catraia diz:
Vcs acabaram de voltar de uma turnê. A Survive, outra boa banda, se articulou junto ao Catraia e embarca pra Sampa agora na sexta-feira pra tocar por lá. As coisas estão acontecendo, não? Você acha que outras bandas também têm condições de circular, tocar em outros lugares, conhecer pessoas e outros trabalhos?

Saulo diz:
Sem dúvida, temos bandas boas e prontas pra isso. Algumas delas, como a Nicles e Marlton, são exemplo disso. Toda banda tem plena condição de rodar via Circuito Fora do Eixo.

Catraia diz:
Vc já tocou em outras bandas e tá nessa caminhada em prol da cena independente em Rio Branco faz tempo. Entre o ontem e o hoje, o que vc acha que mudou?

Saulo diz:
Mudou muita coisa...De lá pra cá, as bandas acreanas sempre mativeram um padrão muito bom de como se comportar, de sensibilidade em compor harmonia e principalmente boas letras... E continuam fazendo. Isso sempre rolou. Mas o que rola hj que não rolava antes é o compromisso com a cena, de se envolver pelo trabalho que vai além de estar produzindo música... E hoje tem muitos outros parceiros que não são de bandas mas que acredita no futuro da cena cultural independente do estado e trabalham nessa parceria.

Carol, Zen e Thiago: os outros que são quase um só.


Catraia diz:
A Filomedusa é formada por pessoas de diferentes idades e áreas. Mas a sintonia de vocês é enorme. Além da música o que mais une vocês?

Saulo diz:
A amizade. Com exceção do Thiago, que conhecemos depois, antes mesmo de sermos Filomedusa já existia uma ligação muito forte entre a Carol [Freitas, a vocalista], o Zen [Daniel, o baixista] e eu. A gente se conhece há uns oito anos.

Catraia diz:
Essa sintonia flui na hora de tocar e de compôr, mas também na hora de discutir as políticas e estratégias da cena acreana. Ainda que feitos de formas diferentes, os discursos de vocês são bem alinhados - com a exceção do Thiago, que é quase mudo! Ahaha! Você, como guitarrista e integrante de banda, encara numa boa esse lema polêmico do "Artista igual pedreiro"?

Saulo diz:
Sim, numa boa. E acredito nele. As grandes gravadoras de hoje "somos nozes" [risos], é a gente mesmo, cara! Se você conseguir alinhar o trabalho de potencializar uma cena e incluir a música no mesmo contexto, tendo como se manter através do trabalho , já é o sucesso. As bandas que estão nesse mesmo contexto dificilmente se portam como estrelas. Elas não cabem nele. Quem segue a linhagem do estrelismo garalmente não consegue muita coisa nesse circuito. Acaba sendo uma seleção natural.

Catraia diz:
As pessoas costuma questionar sobre o nome da banda? Nos shows a Carol sempre dá uma explicação rápida sobre o assunto. Já ouvi ela dizer que é uma rã, depois que é um sapo. Afinal, a Filomedusa é um sapo ou uma rã? Ahahaha!

Saulo diz:
Hehehe! Na verdade é uma rã. Das costas dela a tribo indígena extrai o Kampô, Kambô ou Kampum, o nome varia de etnia pra etnia, que tira a panema ( os males) e nos fortalece.

Catraia diz:
Tira os males e fortalece? É como o som de vocês! Hahaha!

Saulo diz:
Hehehe!


Ócio Criativo






Com os pés no Acre, mas a cabeça ainda nos lugares por onde passou com sua banda, Saulinho Machado, guitarrista e compositor da banda Filomedusa, garante que a melhor coisa que uma banda pode fazer para si e para os seus é circular. Prova disso é sua última composição, Tema Parati, concluída pós-viagem, reforçando os benefícios de sua pequena teoria. "Eu tinha só o início dessa música. Aí ontem me veio ela por inteiro", disse. Saulinho é um dos que se encaixam perfeitamente no lema artista igual pedreiro. Cria como ninguém, mas também trabalha. Ócio? Só se for o criativo.

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